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O fracasso da Teoria de Kirkpatrick e os resultados de T&D

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O ano era de 1976, quando o então professor Donald Kirkpatrick, da Universidade de Wisconsin, criou e apresentou o seu novo modelo de avaliação de aprendizagem para treinamentos corporativos. O modelo, conhecido como Teoria de Kirkpatrick, foi adotado por diversas empresas e ao longo de décadas e continua sendo utilizado massivamente nas empresas.

Apesar de consolidada, ao trazer para o dia-a-dia das organizações, a Teoria de Kirkpatrick falha em apresentar resultados e impactos verdadeiramente estratégicos para os programas de treinamento.  Ao mesmo tempo, os gestores das organizações se questionam sobre o retorno e a validade dos investimentos em treinamento.

A pergunta que fica é: como parar de “tentar justificar” as ações de T&D e comprovar resultados reais?

Para responder essa pergunta e nos ajudar a entender o cenário atual, convidamos Alê Marinho, nosso Learning Strategist  e especialista no mercado de treinamento há mais de 20 anos, para falar um pouco sobre o tema.

 

Alê, você é um grande defensor de mudanças no que se relaciona a avaliação dos programas de treinamento. Em suas palestras, você costuma falar sobre a necessidade de deixar de lado a “visão de T&D“ e olhar para a capacitação com uma “visão de negócio”. Dentro desse contexto, como você enxerga a aplicação dos modelos de avaliação de Kirkpatrick nas organizações?

 

Em primeiro lugar, acho importante ressaltar que a Teoria de Kirkpatrick foi fundamental para os processos de aprendizagem. Sem ela o T&D não teria evoluído.Eu já utilizei esse modelo de avaliação em diversos momentos, mas problema é que ele é incompatível com as necessidades de impactar resultado das empresas. Se trata de um modelo extremamente subjetivo, e que é utilizado de forma equivocada na maioria das empresas.

Eu trabalho nesse mercado há mais de 20 anos e, ainda hoje, vejo mais pessoas preocupadas em saber se a audiência gostou do coffee break do que se preocupar com os objetivos das ações de T&D e o que elas deveriam se propor a fazer. O quanto uma avaliação de reação comprova a efetividade do aprendizado? O problema está na relevância que se dá às coisas.

Particularmente, eu defendo que todo profissional de treinamento deve ser primeiro uma pessoa de negócios. É preciso que o T&D compreenda a jornada da empresa, suas metas, seus processos, os fatores que impedem a organização de atingir seus objetivos. Isso é fundamental ao se desenhar programas ou ações de aprendizagem.

A teoria em si não é o problema, quando eu digo que ela fracassou, quero alertar para a forma que as empresas aplicam esse modelo de avaliação.

 

Por que você acredita que o “fracasso da Teoria Kirkpatrick” está ligada a aplicação do modelo?

 

Existe um um problema de interpretação e conhecimento.

Muito do que se faz em treinamento é empírico. Falta formação profissional, falta uma lógica de dados e, acima de tudo, existe nenhuma ou quase nenhuma análise. Tudo é baseado em “achismos”. Como o T&D pode ser capaz de comprovar números e ROI, se a própria definição de objetivos – que deveria ser o começo do processo – não está baseada em uma análise ou vinculada à objetivos estratégicos?

Esse é um ponto crítico na minha percepção. Você pode usar Kirkpatrick, 70:20:10, ou qualquer outro modelo. Se faltar conhecimento e visão de negócio, o caminho é o fracasso para aplicação de qualquer metodologia de avaliação ou aprendizagem.

 

E como você acredita que os times de Treinamento e Desenvolvimento deveriam atuar para gerar e comprovar esses resultados?

 

Eu vou dividir essa resposta em 3 partes. A primeira delas é o que eu já comentei. Todo profissional de T&D deve ser uma pessoa de negócios. O que eu quero dizer com isso é que essas pessoas devem estar atentas às metas estratégicas da empresa. É preciso entender para onde a organização está indo, criar conexões com outras áreas.

O seu envolvimento nos diferentes contextos da organização, fará com que você seja mais assertivo em suas ações e, acima de tudo, alcance os resultados esperados.

Segundo: crie metas acionáveis e garanta que sua área está alicerçada em pilares sólidos. O treinamento deve criar a ponte entre os objetivos e métricas e o conhecimento. Esses pontos precisam estar conectados às diretrizes da empresa.

Terceiro: seja o guardião do conhecimento. O T&D deve atuar para garantir que todo conhecimento disponível na empresa seja organizado de uma forma objetiva e que ele seja entregue para pessoa certa, da forma certa.

O grande desafio está em ser capaz de direcionar todas as pessoas para um mesmo objetivo.

 

Você pode nos falar um pouco mais sobre esse desafio?

 

O treinamento precisa ser visto como uma forma de levar a empresa e os usuários do ponto “A” ao ponto “B”. É preciso entender onde a organização está, onde ela quer chegar e quais os conhecimentos necessários para isso. Desta forma, o T&D se torna capaz de guiar a empresa para uma mesma direção.

Isso permite ao treinamento vincular suas ações aos objetivos e gerar valor para o negócio. O T&D se torna relevante e indispensável, ele passa a fazer parte ativa da estratégia. 

Outros aspectos desafiadores estão em transformar a empresa em uma learning organization e, com isso, fomentar uma cultura de aprendizado em alto nível e com foco em resultados.

Aumentar a produtividade e contribuir para a redução de custos é o que resume tudo isso.

 

Para finalizar, como você vê o mercado de T&D daqui para frente?

 

Eu vejo que ainda temos um longo caminho a percorrer. A Educação Corporativa – como é chamada agora no Brasil – ainda está imatura e incipiente. Falta formação profissional e renovação de fato.

Existe muito “blablabla” no mercado e bilhões de teorias que prometem resolver tudo. Mas, na prática, não funciona assim! Costumo falar algo que reflete muito a realidade do treinamento: não existe uma fórmula mágica ou a bala de prata. Cada empresa, cada grupo e cada indivíduo possui necessidades específicas e enquanto isso não for entendido na raiz, iremos evoluir lentamente.

Isso se aplica, também, à Teoria de Kirkpatrick. Como seremos capazes de avaliar o impacto de algo, se nem entendemos como as causas raízes dos problemas das nossas organizações e trabalhamos – quando trabalhamos – em sintomas?

O problema não está no modelo de avaliação do treinamento. Está nos times de T&D serem, em sua maioria, incapazes de atuar de forma proativa e saberem onde atuar.